"O Homem põe e Deus dispõe"
(provérbio)
(provérbio)
O dia do terramoto amanheceu nada menos que lindo. Uma manhã soalheira, nem uma nuvem no céu. Sete horas da manhã, quando o céu ficou cor-de-rosa e a vida começou. Ele, e ela, de mão dada, olhavam ao longe da varanda da sua casa. Tinha sido a sua primeira noite da nova vida. Não tinham verdadeiramente fugido da antiga, mas apenas dado o passo em frente. A sua casa nova estava pronta, e reluzia com os primeiros raios da manhã. O silêncio, apenas entrecortado pelo primeiro chilrear dos pássaros, era o primeiro sinal de que nada era como antes.
Ainda fazia frio. Fevereiro mal tinha começado, e apenas agora os dias começaram a crescer. Eles olharam-se, enquanto o Sol começava a despontar no horizonte. Trocaram um beijo no silêncio. Sorriram um para o outro. Depois, tudo o resto foi muito rápido. Rápido demais. Primeiro um tremor, que tomaram como um arrepio de frio. Mas não. Depois correram, uma mão para cada lado, escadas abaixo, porta fora, longe da casa. Tremores mais fortes. Era um daqueles momentos em que não pensavam, não sentiam, não respiravam. A mão que mantinham dada um ao outro, não a sentiam. Apenas a crueza dos factos que viam à sua frente. Apenas a vida, assim como a casa, assim como tudo, que viam desmoronar-se à sua frente.
Aos poucos, nuvens de pó foram aparecendo à esquerda e à direita. Casas, perdidas. Depois a sua, e a dos vizinhos, e os prédios. Tudo quanto estava de pé rapidamente se deitou. Menos eles. Foram os cinco minutos mais longos das suas vidas. Tinham a certeza que daqui a muitos anos ainda se lembrariam daqueles cinco minutos, como se de alguma forma ainda os vivessem, como quem olha para uma lâmpada e fica com o reflexo da luz nos olhos durante muito tempo.
Quando a calma voltou, eles sabiam. Olharam-se. Depois, olharam para cima. Nenhum deles acreditava em nenhum deus, mas não conseguiram evitar. Isto era mais que eles, era acima deles. Logo naquele dia. Aquela terrível coincidência. Olharam de novo um para o outro. Depois choraram. Choraram longamente, abraçados, corações a bater descompassados, e pensamentos a passar a milhares de quilómetros por hora.
Aos poucos haveriam de recuperar. E não decorreria uma hora antes de ambos voltarem ao que sobrou da sua casa. Onde antes estava o sonho de uma vida, agora havia escombros. E só eles sabiam quanto custava ver os sonhos por terra. Não fazia mal. Eles eram fortes. Tinham chegado ali. Retornariam ao ponto de partida, e de novo recomeçariam. Ainda os corações batiam descompassados, e os pensamentos corriam à velocidade da luz; ainda as lágrimas não tinham secado quando ele lhe murmurou ao ouvido aquela que seria a palavra que doravante os poria de novo no rumo do seu sonho: “Persiste!”
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