“Quando eu morrer voltarei para buscar
os instantes que não vivi junto ao mar”
Sophia de Mello Breyner Andresen
os instantes que não vivi junto ao mar”
Sophia de Mello Breyner Andresen
Eu conheço o mar. Eu posso dizer, com alguma vaidade mesmo à mistura, que conheço o mar. Não o conheço todo, como é óbvio. Mas conheço. Vejo-o ao acordar, e vejo-o ao adormecer. Vejo quando a luz rosa do nascer do sol se reflecte no mar, e vejo quando a luz laranja lhe deita os seus últimos raios do dia. Vejo a lua reflectir-se nas ondas, e medir a ondulação a partir fraca luz dos candeeiros da rua reflectida.
Eu conheço o mar no Verão e no Inverno. Nos dias de tempestade e de bonança, de luz e de névoa, de chuva e de seca. Nos dias de calor e nos dias de frio. Eu conheço o mar frio, e conheço o mar quente. E conheço o mar do Minho e o mar do Algarve. E o mar de Lisboa feita Império, e o da Beira feita Litoral e do Alentejo feito maresia. Sim, eu sei qual é a sensação de navegar, e a sensação de estar na praia, e a sensação de estar mergulhado a deixar-se levar ao sabor da corrente.
Eu sei, ainda mais do que isso, qual é a sensação de estar feliz. A sensação de não sentir nada senão a mais pura completude, a mais perfeita fusão, a mais infantil felicidade. É o mar. É o mesmo mar de quando era pequeno. O mesmo onde brinquei, onde mergulhei, onde ainda hoje mergulho. O mesmo onde curei feridas do corpo, e feridas da mente. O mesmo do qual nos afastamos, e o mesmo para o qual voltamos. Porque “melhor que ir, só mesmo voltar”.
E eu conheço, acima de tudo, a minha maior visão do paraíso. Se o paraíso for “a melhor coisa do mundo” para cada pessoa, o meu paraíso tem de ter mar. É impossível não ter. É impossível o meu paraíso não contemplar um dia de calor abrasador, com o sol no seu ponto mais alto, e um imenso mar à minha frente, calmo, sereno, tépido. É impossível eu não poder ficar eternamente por baixo do meu chapéu-de-sol, a ler todos os livros que queria ter lido antes de morrer, e em frente a este mar. A ouvir toda a música que não tive tempo para descobrir ou conhecer. Ocasionalmente uma onda mais marota num dia de maré mais cheia vir-me-á beijar delicadamente os pés, e relembrar-me como o mar é frio. E como o sol é quente.
No meu paraíso haverá mar. No meu paraíso eu poderei ver o mar todos os dias. Eu poderei ver o Sol a nascer no fundo do mar, e o Sol a pôr-se no fundo do mar. Eu poderei ver o mar tomar todas as cores, poderei ver o mar envelhecer enquanto eu, já morto, o acompanharei para sempre. E se o meu paraíso não tiver mar? Não faz mal. Nesse caso terei apenas de voltar a nascer, para de novo poder viver junto ao mar.
Sabia que ninguém melhor do que tu poderia pegar nesta frase e dedicar-lhe um genuino amor ao mar =)
ResponderEliminarAdorei verdadeiramente o teu texto, o teu encadeamento. A forma simples como pequenas frases conseguiste descrever tudo aquilo que eu propria sinto quando vejo o Mar e quando leio esta fantástica frase da Sophia.
Muito bom! =)
Decididamente, muito bom mesmo, sobretudo o final =)
ResponderEliminarE que peso enorme senti eu com essa frase, deixa-me que te diga... Escrever um texto a uma frase de Sophia é como explicar ao Eusébio como jogar futebol =P
ResponderEliminarMas obrigado :D E venham muito mais temas com o mar, ehehehe :)