terça-feira, 25 de maio de 2010

Desafio XXII - resposta

Sabe que falou do seu cansaço, da sua doença diária.
Que tentou médicos e paciências alheias.
Tratamentos fictícios que nunca resultaram
na sua preguiça estagnada,
Propaganda indefinida dessas massas de gente.
Corpos autómatos que lhe procuravam o botão do “on” cada vez que ele dizia
“Estou cansado”

Era uma doença. Pior do que a lepra ou a SIDA,
porque borbulhava da profundeza única do desejo de não ser nada e não quer ser nada e não valorizar quem é alguma coisa.
“Estou cansado”, disse ele tanta vez
E logo um fedor a fraqueza se instalava
nos ambientes da sua vida.
E logo os corpos que por ali passavam se massajavam de adrenalinas fúteis,
desejos vadios para expulsar aquela doença contagiosa.
Que pobreza. Que falta de felicidade.

E já nem ele se lembrava. Era um efeito secundário,
dos comprimidos que nunca lhe deram.
Como se aquela inércia de se levantar e abrir as persianas do quarto
fosse mais uma mobília que ele comprara.
Já nem se lembrava. Tivera sonhos?
Correra para apanhar o autocarro?
Amara?
Mas às vezes lembrava-se.
Ele fora o sonho que eles não ousavam,
quando cansados de mentir,
adormeciam em estrados de algodão e abortavam
esperanças.

E estar cansado daquele cansaço
era o seu último pedaço de
si.
Uma curta dose de eutanásia;
A rebeldia que rejeitava todos
os dias o veneno que lhe injectavam.

Por isso não se mexeu, enquanto a música tocava.
O disco estava riscado.

“… Sick and tired of being
       sick and tired of being
       sick and tired of being
       sick and tired of being
       sick and tired of being …”

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